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“Brain rot”: a palavra do ano de Oxford e o apodrecimento mental na era digital

  • Rodrigo Augusto Prando
  • 4 de dez. de 2024
  • 3 min de leitura

Por Rodrigo Augusto Prando


Todos os anos a prestigiosa Universidade de Oxford escolhe a palavra do ano, refletindo tendências linguísticas, sociais e culturais. Em 2024, a palavra escolhida foi “brain rot”, que pode ser traduzida como “cérebro apodrecido” ou “atrofia cerebral”.


O  Dicionário de Oxford define brain rot como a “suposta deterioração do estado mental ou intelectual de uma pessoa, especialmente vista como resultado do consumo excessivo de material (principalmente conteúdo on-line) considerado trivial ou pouco desafiador”. Ainda segundo o referido dicionário, o termo foi usado pela primeira vez pelo escritor Henry David Thoreau na obra “Walden, ou A vida nos bosques”, de 1854. No livro, Thoreau descreve uma sociedade em crescente complexidade e sua decisão de se mudar para a propriedade de um amigo, às margens do lago Walden, onde  viveu em uma cabana, construindo móveis, cultivando plantas e preparando sua própria comida. Teve, nesta experiência, descobertas espirituais. Para os dicionaristas de Oxford, ao utilizar “brain rot”, Thoreau assevera a tendência da sociedade da época em desvalorizar ideias complexas em favor das mais simples. De Thoreau muitos conhecem a obra “A desobediência civil” e, agora, vale acrescentar à lista “Walden, ou A vida nos bosques”.


A palavra do ano chegou pela mídia e, paradoxalmente, por meio das redes sociais. Esse cérebro deteriorado e a busca do trivial e de ideias simples em detrimento de conteúdo mais sofisticado e complexo traz à tona outros três livros que, de uma forma ou de outra, podem ser conectados a essa discussão: “O cérebro no mundo digital”, de Maryanne Wolf; “Eu sei o que você anda lendo ... como os algoritmos vêm mudando a nossa leitura, escrita e pensamento, de June Lessa Freire; e, mais recente, “A geração ansiosa: como a infância hiperconectada está causando uma epidemia de transtornos mentais”, de John Haidt. Penso que, ao menos estes três livros, possam ajudar a melhor compreender o que se passa, na última década, com nosso cérebro.


A tecnologia, como bem sabemos, é uma ferramenta e sua utilização pode ser positiva ou negativa, a depender de quem a usa e de como a usam. Pois bem, as redes sociais são, assim, meios fundamentais para aproximar indivíduos e grupos, conectando pessoas separadas por enormes distâncias ou posições sociais; permitem acesso à informações incomensuráveis e consolidação de conhecimentos em todas as áreas do saber humano e podem, especialmente no campo político, mobilizar energias para o campo democrático e republicano. Mas, podem, também, servir de plataforma para o discurso de ódio, para as fake news, teorias da conspiração, pós-verdades, negacionismo e ataques aos alicerces dos valores democráticos. O cérebro, bastante plástico, principalmente nos anos iniciais das crianças, estão sendo moldados não mais num mundo – como aduz Haidt – do livre brincar e sim num mundo hiperconectado, do smartphone. Nossa sociabilidade, portanto, depende de um cérebro social e este vai perdendo conexões reais de interação entre as pessoas para “encontros” frios, distantes e  para a cultura da  velocidade, do imediatismo e superficialidade.


Quem, nos dias que correm, educam seus filhos ou são professores, tem indícios de que isso – o cérebro deteriorado -  está presente nas crianças e jovens de forma avassaladora. Cabe investir em relacionamentos presenciais e saudáveis, muita leitura (de livros) e uso comedido das redes sociais. O cérebro pode apodrecer, mas, também, pode tornar-se ativo, crítico e generoso de acordo com nossas experiências.


  • Rodrigo Augusto Prando é professor e pesquisador na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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